O mundo nunca foi tão grande quanto se supõe que seja para
ela. Havia cercas em toda parte erguidas sob as mais variadas desculpas. A
violência das grandes cidades, a marginalidade dos subúrbios paulistanos, a
superproteção materna.
Depois teve a timidez, o horror às multidões, a dificuldade
em fazer amizades, aliás, a dificuldade em cultivar amizades. Um pequeno
príncipe às avessas, jogava sal em todas as raízes fraternais que pudesse
perceber. Poucos a cativavam, na verdade, contentava-se com a observação dos
outros mantida certa distância mínima de segurança.
Assim, o mundo ia tomando o restrito tamanho das obrigações
inadiáveis, estreitado pelas relações sempre evitadas. Duas linhas retas
traçadas no chão da cidade resumiriam todo o seu universo de movimento. Não
havia, portanto, pessoa mais previsível.
Isso se não levarmos em conta que o mundo é bem maior do que
se revela na matéria. Acima do espaço existe o tempo, e nele o tempo
psicológico, no qual anos podem ser vivenciados em minutos. Tempo cujo conteúdo
não se deixaria resumir por poucas laudas de explicação. E havia o espaço
dentro do tempo, aquele capaz de nos levar à toda parte, atrás dos sons e
formas insinuadas; imaginação, arriscariam. Pensamento, liberdade, sonho. Itens
tão escassos no mundo de hoje, acorrentados pelas ideias preconcebidas apregoadas
por todos os meios comunicativos. Mortas a curiosidade e a criatividade do
mundo moderno, quem as consegue cultivar em vasos escondidos é dono de
inestimável fortuna.
Ela as possuía. Guardava em segredo esses portais para
outros mundos dentro de seu silêncio, mesquinha, como sempre, com aquilo que
deveria revelar aos outros.
Quem a via, contudo, não podia supor. Deixava transparecer
apenas o silêncio mudo, os passos lentos e repetitivos, o ir e vir cronometrado
das obrigações cumpridas a contra gosto. Mas, por dentro, ela sabia. O mundo
não tinha limites.
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