domingo, 13 de julho de 2008

O Império da Vida




Ele decidiu que não mais se sujeitaria àquela droga. Cansou das cobranças absurdas, das injustiças, de toda a morte, inveja, ódio, sujeira. O mundo fedia, e não era ele que ficaria ali esperando que aquele mundo fétido apodrecesse de uma vez. Fugiu.

Pensou em ir para as montanhas, mas perto do céu estaria perto de Deus, e ele não estava pronto para ser vizinho do Onipotente. Pensou em morar num barco e navegar infinitamente. Desistiu logo. Aquele constante movimento o lembraria da correria da cidade. E a cidade agora estava morta, ele próprio a matara...

... exatamente, ele não somente fugira, ele matara toda a vida, exterminara todos os viventes, aquele mundo não merecia existir. Aqueles filhos malditos de mães envenenadas mereciam perecer. A luxúria dos homens teve um fim: a lâmina de sua faca. Mais sangue existisse, mais sangue escorreria, mais pescoços seriam talhados, mais cabeças seriam esmagadas, mais casas incendiadas... não descansou até que o último suspiro de vida se extinguisse.O último homem suicidou-se ao ver o Exterminador da raça.

O mar era muito belo, lembrava vida, movimento, fluxo e refluxo, e dali pra frente nada viria nem iria, as coisas apenas seriam. Findou a era das aparências, ele acabara de fundar a era do Ser: somente o ser.

Decidiu rumar para o grande Deserto, o deserto sem fim que hoje tinha fim, porque quem não acha fim nas coisas é o Homem, e o Homem morrera. Só restara o Exterminador, o último eterno. A aridez seria sua cama, a areia cobriria seu corpo, o vento faria companhia. Os seres rastejantes sim, compreendiam os segredos da terra, os mistérios da terra. Eles seriam a próxima raça a dominar o globo, era óbvio, qualquer tolo via, que a antiga raça era incompleta, insegura.... os rastejantes preservariam a essência.

Decidiu cavar um buraco para encontrar o centro do mundo, de onde emanava toda a vida, e começou a cavar bem no centro do grande Deserto. Cavou dias e noites, até gastar as pás... até que sua vida já estava quase toda gasta... e só alguns suspiros lhe restavam antes que sua alma estivesse liberta de seu corpo. E encontrou a fonte da vida. A fonte enfureceu-se com a visita do Exterminador. Ela perdera seus filhos e precisava da sua vingança!

A vida jorrou do buraco, para todos os lados, inundando o deserto, afogando os seres que rastejam, carregando árvores, apagando incêndios. A água queria devorar o mundo, estava sedenta por lamber toda a face da terra, e lavá-la e sentir seu gosto. Finalmente não havia quem construísse diques, finalmente a terra era fecundada novamente pela água do ventre da própria terra.

Todo o mundo cobriu-se de água, e não havia mais lugar para a morte, todos os seres podiam respirar debaixo da água, todos os cadáveres apodreceriam sob a água e alimentariam os seres aquáticos, e a raça dos Homens continuaria existindo infinitamente, pois sua seiva fluía por toda a parte, em todos os corpos, em todas as direções, num eterno fluxo de ir e vir sobre a Eterna Água.

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